6. Desfecho Morbi-Mortalidade Materna

06/03/2023

A morte materna e a morbidade materna grave são os desfechos adversos de curto prazo para a saúde da mulher, resultantes desta cadeia de determinantes apresentados.

Os indicadores a seguir podem ser usados para monitorar os desfechos de morte materna e de morbidade materna grave nos estados e nos municípios. Entenda como eles se comportam no Brasil e no mundo e como estão relacionados com a mortalidade materna.

Entenda o modelo teórico de acompanhamento dos indicadores.

a. Razão de mortalidade materna

A Razão de Morte Materna (RMM) é um indicador que mede o número de óbitos maternos para cada 100 mil nascidos vivos.

Os óbitos maternos são raros e, no Brasil, mais de 4 mil municípios de pequeno porte não registram óbitos maternos regularmente, e mais de 2 mil não registraram morte materna entre 2012 e 2020.

Isso não significa que as mulheres residentes nesses municípios não sejam vulneráveis ao óbito materno, nem que o óbito materno seja uma “fatalidade”. Nesses municípios com pequeno número de nascimentos, a ocorrência de apenas um óbito materno resulta numa RMM muito elevada, muito superior à meta nacional de alcançar uma RMM inferior a 30 por 100 mil nascidos vivos.

A raridade do óbito materno pode mascarar as falhas de assistência que aumentam as chances de um desfecho trágico. Mas, assim como na história de Aparecida, a ausência de mortes maternas não significa que esse evento não possa acontecer. Por isso, é importante que sejam monitorados os fatores de risco da mortalidade materna, pois é com o conhecimento desses determinantes que podemos desenvolver políticas para evitar novas mortes maternas.

b. Proporção de óbitos por causas obstétricas diretas

Dos óbitos maternos, aqueles determinados por causas obstétricas diretas são os que podem ser reduzidos por meio de melhoria da assistência pré-natal e ao parto, sendo um importante indicador a ser monitorado.

No mundo, estima-se que aproximadamente 73% dos óbitos que ocorreram no período 2003-2009 foram por causas obstétricas diretas e 27.5% por causas obstétricas indiretas [1].

No Brasil, as causas obstétricas diretas responderam por aproximadamente 60% dos óbitos maternos no período 2012-2019, com aumento das causas obstétricas indiretas em 2020, em decorrência da pandemia de COVID-19.

c. Proporção de óbitos maternos segundo principais causas

Conhecer as principais causas dos óbitos maternos é importante para o planejamento dos recursos em saúde.

No mundo, as principais causas de óbito materno no período 2003-2009 foram as hemorragias (27,1%), doenças hipertensivas (14%) e infecção (10,7%). Abortos (7,9%), embolia (3.2%) e outras causas diretas (9,6%) foram as outras causas mais frequentes [1].

Entretanto, existe variação das causas mais frequentes nas diversas regiões. A América Latina apresenta a maior proporção de óbitos por doenças hipertensivas e por aborto no mundo [2].

As causas hipertensivas são a principal causa de óbito materno no Brasil.

d. Proporção de casos de morbidade materna grave em internações obstétricas

Uma mulher que quase morreu, mas sobreviveu a uma complicação grave durante a gestação, parto ou puerpério, é classificada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como um caso de Near Miss Materno.

Esses casos, que também podem ser chamados de “morbidade materna extremamente grave”, são muito mais frequentes do que os óbitos maternos, mas apresentam os mesmos determinantes. Por essa razão, a OMS propõe que eles também sejam analisados como forma de avaliar a qualidade da assistência prestada às mulheres, sendo particularmente úteis nos locais com baixa frequência de óbitos maternos.

No mundo, estima-se que a razão de Near Miss materno seja de 1,4%. Na América Latina, esse valor é de 1,1% ou de 11 por 1000 nascidos vivos [3]. No Brasil, dois estudos de âmbito nacional estimaram valores próximos a 10 por 1000 nascidos, o que é um valor aproximadamente 20 vezes maior do que a Razão de Mortalidade Materna.

A figura abaixo descreve o gradiente da morbidade materna, partindo de gestantes sem qualquer complicação até os casos mais graves de óbito ou de Near Miss materno [4].

No Brasil, o Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS) é o único sistema de informação existente que dispõe de dados de morbidade. Entretanto, ele não permite classificar os casos de Near Miss Materno conforme recomendado pela OMS, pois essa classificação depende de informações que não estão disponíveis no SIH/SUS, como resultados de exames e medicamentos utilizados.

Uma outra classificação recomendada pela OMS identifica as “condições potencialmente ameaçadoras à vida”. Essa classificação se baseia em diagnósticos e procedimentos realizados, sendo possível de ser estimada a partir de dados do SIH/SUS.

Baseado no critério da OMS de “condições potencialmente ameaçadoras à vida”, foi proposto um indicador de morbidade materna grave construído a partir de dados do SIH/SUS.

Esse indicador permite verificar a proporção de casos de morbidade materna grave identificados nas internações obstétricas, que podem ser monitorados ao longo do tempo em determinada região, ou comparadas entre regiões diversas, referindo-se sempre às mulheres internadas em serviços públicos.

O indicador permite também avaliar as principais causas da morbidade (hipertensão, hemorragia, infecções) e os principais indicadores de gravidade no acompanhamento das mulheres (cirurgias, internação em Unidade de Terapia Intensiva – UTI, tempo de internação prolongada e transfusão sanguínea).

Essas informações podem auxiliar os profissionais e gestores a identificar as principais causas da morbidade materna e também a planejar os recursos assistenciais necessários.

Acesse o painel com os indicadores aqui e identifique as situações de maior vulnerabilidade em seu município ou estado.

Referências

[1] Say L et al. Global causes of maternal death: a WHO systematic analysis. Lancet Global Health 2014; 2:e323-e333
[2] Lawrence ER, Klein TJ, Beyuo TK. Maternal Mortality in Low and Middle-Income Countries. Obstet Gynecol Clin N Am 2022; 49(4):713-733.
[3] Firoz et al. Global and regional estimates of maternal near miss: a systematic review, meta-analysis and experiences with application. BMJ Global Health 2022;7:e007077.
[4] Say L, Souza JP, Pattinson RC et al. Maternal near miss – towards a standard tool for monitoring quality of maternal health care. Best Pract Res Clin Obstet Gynaecol 2009; 23: 287-96.